E agora Janja: Primeira-dama recebe duro comunicado ‘Vai ter que se explicar’

Viagens de Janja sob escrutínio: ação popular questiona uso de recursos públicos
Pedido de depoimento judicial reacende debate sobre papel institucional da primeira-dama e os limites do uso de verbas públicas para agendas internacionais
BRASÍLIA — A presença ativa de Rosângela da Silva, a primeira-dama Janja, em viagens oficiais nacionais e internacionais voltou ao centro do debate político e jurídico. Desta vez, por meio de uma ação popular que questiona a legalidade do uso de recursos públicos para custear seus deslocamentos. O caso, que tramita na 9ª Vara Cível da Justiça Federal do Distrito Federal, ganhou novo fôlego com o pedido de que Janja preste depoimento formal sobre os gastos com suas viagens, sob suspeita de ausência de respaldo legal.
A solicitação foi protocolada pelo vereador de Curitiba Guilherme Kilter (Novo) e pelo advogado Jeffrey Chiquini da Costa, conhecido por sua atuação alinhada à direita bolsonarista. A dupla busca a anulação dos atos administrativos que autorizaram o pagamento de passagens aéreas da primeira-dama, argumentando que ela não ocupa cargo público formal que justifique o uso de dinheiro público em deslocamentos, especialmente em classe executiva.
Gastos sob análise: R$ 237 mil em passagens comerciais
Segundo dados extraídos do Painel de Viagens do Poder Executivo, desde o início do governo Lula em janeiro de 2023, Janja acumulou cerca de R$ 237 mil em passagens aéreas comerciais. O valor, embora relevante, não inclui viagens realizadas em aeronaves da Força Aérea Brasileira (FAB), tampouco os gastos com a equipe de apoio que a acompanha.
As viagens comerciais foram feitas, em sua maioria, em classe executiva, um privilégio que, conforme a regulamentação vigente, é reservado a ministros de Estado ou servidores em funções de alto escalão. A ausência de uma norma clara que defina o papel e os direitos da primeira-dama no serviço público tem gerado interpretações conflitantes, abrindo margem para contestações judiciais.
Compras em cima da hora elevam custos
Um dos pontos que mais chamou atenção no levantamento é o padrão de compra das passagens. Em 140 das 144 viagens registradas por Janja e sua comitiva, os bilhetes foram adquiridos com menos de 15 dias de antecedência, sendo que, no caso específico da primeira-dama, nenhum voo foi comprado com mais de nove dias de antecedência.
Essa prática, segundo especialistas em gestão pública, eleva significativamente os custos e pode indicar falhas de planejamento. Para críticos, trata-se de um indício de má administração dos recursos públicos, reforçando a percepção de que a atuação da primeira-dama ocorre em um vácuo institucional que demanda maior controle.
Entourage em missões oficiais: estrutura de autoridade informal
A primeira-dama costuma viajar acompanhada por uma equipe de cerca de dez profissionais, incluindo fotógrafos, assessores de imprensa, cerimonialistas e até um militar, que atua como ajudante de ordens. A estrutura, embora informal, replica a de autoridades públicas com cargo oficial, como ministros e secretários de Estado.
Essa presença reforçada de Janja em eventos diplomáticos e missões internacionais tem sido defendida por aliados do presidente Lula como uma estratégia de valorização de pautas sociais e ambientais, além do fortalecimento da imagem do Brasil no exterior. No entanto, a falta de previsão legal específica para seu papel gera desconforto entre opositores e operadores do direito público.
Pedido de depoimento judicial: um marco inédito?
O pedido para que Janja preste depoimento presencial em juízo é considerado incomum — e, caso aceito, pode marcar um precedente. Segundo os autores da ação, é necessário que a primeira-dama explique pessoalmente o contexto de suas viagens, como são feitas as escolhas de deslocamento e quem autoriza os pagamentos.
A Justiça ainda não decidiu se acatará a solicitação. Caso a ação avance e a argumentação dos autores seja acolhida, Janja poderá ser obrigada a ressarcir os cofres públicos, além de provocar uma reavaliação sobre os limites de atuação de figuras públicas sem cargo oficial.
Silêncio oficial e clima de embate
Procurada pela reportagem, Janja não se manifestou até o momento. Foram feitos contatos com sua assessoria pessoal e com a Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), mas não houve retorno. O espaço permanece aberto para eventual posicionamento da primeira-dama ou de representantes do governo.
O episódio alimenta a já acentuada polarização política, com a oposição tratando o caso como exemplo de supostos privilégios e falta de transparência, enquanto apoiadores do governo apontam para um ataque político travestido de ação jurídica, como forma de deslegitimar a presença ativa da primeira-dama.
Debate institucional: papel da primeira-dama segue sem regulamentação
A controvérsia sobre o papel da primeira-dama não é nova no Brasil, mas se intensifica em contextos de maior exposição política. Durante o governo Bolsonaro, Michelle Bolsonaro também participou ativamente de eventos oficiais e campanhas sociais, embora com menor presença em agendas internacionais. Nenhuma regulamentação específica foi aprovada desde então para delimitar o escopo de atuação da figura da primeira-dama.
A decisão judicial sobre o pedido de depoimento de Janja poderá abrir caminho para definições mais claras no futuro, seja pela via legislativa, seja por jurisprudência. Até lá, o tema deve continuar sendo explorado como combustível para o debate político e como um teste institucional sobre os limites do uso de recursos públicos por pessoas sem cargo oficial.